domingo, 27 de julho de 2008

Pode beijar a noiva...



É Primavera e está uma noite serena, enquanto eu observo as estrelas e penso em ti. Dá-me a entender que, desde que chegaste a minha vida, como um forasteiro vindo de um país que nem sei, tudo se resume a uma simples verdade: Tu!


Eu sei que não devia ser assim. Mas de nada valem os olhares desaprovadores de Sofia, ou as palavras encorajadoras de tantos demais, porque na verdade aqueles que me podiam suster eclipsaram-se, assim como se de nada se tratasse. E eu pergunto-me: afinal onde param a minha atitude, a minha dignidade? Ao que a pergunta cai na lama sem um reflexo de dúvida, sem ninguém que a conteste. Admito que elas não foram muito generosas, pois no momento em que tu decidiste viajar para um outro país qualquer, creio que elas decidiram acompanhar-te nessa viagem deixando-me desprovida de qualquer sentimento. Ou então estão numa esplanada qualquer com tantas outras atitudes e tantas mais dignidades como se de uma reunião de uma nova associação, a associação dos sentimentos órfãos, se tratasse. Como se o abismo das nossas existências já não fosse suficiente e pela falta daquele pedaço que nos torna inteiras os nossos sentimentos apunhalam-nos sarcasticamente incógnitos e pacíficos, mergulhando-nos num caos desumano.

Creio que a minha dignidade se arrasta pelo chão sujo da cozinha o qual ainda não tive tempo de limpar. Confesso que o ‘não ter tempo’ é sinónimo de ‘deixa andar, faz-se depois’. Também, quem é que vai reparar na imundice? O meu tempo é gerido única e exclusivamente numa só coisa: a pensar em ti. De tal forma que nem tenho tempo para as refeições o que faz de ti o meu suplemento diário. E no final de contas até há alguma coisa de bom no meio de tudo isto. É que finalmente consegui perder o pneu irritante que aparentemente te incomodava tanto.

Dói pensar que esta foi a única escolha que tivemos. Custa-te a admitir que foi eu que te deixei... Eu disse 'que te deixei', certo? Bem na verdade acho que foi mútuo, e confesso que já estava farta daquilo… Bom, na verdade... Quer dizer… Pronto, admito! Dói pensar que me deixaste.

É sempre tão desmoralizador, destrutivo até, o facto de sermos largadas, esquecidas, trocadas ou na pior das hipóteses usadas… O que seja. Para eles existem sempre soluções mais práticas… E na verdade não é por falta de devoradoras à solta. O que é certo é que eu não quero tornar-me numa feminista frustrada, porque frustrada já estou. A vida continua e eu sei disso, no entanto por vezes dá-me vontade de pousar a bagagem e soltar um grito.


Ouvi dizer um dia: ‘O mundo é aquilo que imaginamos…’. Será mesmo assim?


- Mas quando é que vais deixar de falar do mesmo assunto? – Bradou Sofia e todas as pessoas a nossa volta ficaram a olhar para ela.

Naquele momento senti-me o centro do mundo. A protagonista no meio de um filme de acção, que embora no meio de uma sinfonia de explosões e objectos que passam a tangente pela sua cabeça, não deixa de ser o alvo do olhar inquiridor de todos os espectadores naquela sala de cinema escura e recôndita. O que mais me inquietou foi o facto de este ser um filme cliché. Aquele tipo de filme em que já sabemos o que vai acontecer mesmo antes de chegar ao fim... Chego a conclusão que muitas vezes após se consagrar o tão bem dito matrimónio e por entre aquelas promessas para toda a vida e ao passo que se vão empurrando as alianças para os dedos um do outro, tudo se desvanece com a mesma rapidez do beijo que se dá em frente aquela plateia enorme e vibrante de emoções. Depois é ver o dedo inchar ao longo dos anos, reflexo de todo o comodismo. De chegar a casa e ficar no sofá agarrado a melhor amiga de sempre, aquela que é tão fácil, que sem grandes pretextos se deixa levar e lhes vai escorregando pela goela a baixo – a tal cerveja!

Mas o facto de dizer o que sinto não muda nada, até porque as palavras não chegam para te trazer para junto de mim. No entanto continuo a preferir ser uma solteira frustrada e em vias de me tornar uma feminista incondicional à procura da sua atitude e da sua dignidade pelos quatro cantos do mundo, do que ser uma caçadora furtiva de homens nesta selva urbana.

E assim será, até ao dia em que naquela catedral as tais palavras vão soar e a plateia vibrará ao rubro das emoções: «Pode beijar a noiva...»